Novo ensino médio – um desafio para a educação brasileira

Aprovado em 2017 e implantado efetivamente a partir de 2023, o novo ensino médio vem sendo alvo de controvérsias entre educadores e gestores da educação, em função das possibilidades desta nova organização pedagógica ampliar ainda mais o abismo da desigualdade social já muito grave na educação brasileira. Em resumo, a mudança principal é a construção de itinerários formativos que de alguma forma “substituem” matérias clássicas no currículo, como, por exemplo, sociologia, filosofia e até educação física.

Segundo a lei que regulamenta o novo ensino médio, os estudantes também devem ampliar sua carga horária de 4h para 5h diárias de estudo, o que em alguns casos, como no ensino noturno, é quase impossível dadas as características do público trabalhador, das escolas e de algumas localidades, que por problemas de transporte e segurança, dentre outros, não oferecem condições de ampliação de horário e consequente carga de estudos ampliada.

Depois da instituição da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), os conteúdos passaram a ser alocados em áreas de conhecimento agrupadas, a saber: Linguagens e suas Tecnologias, Matemática e suas Tecnologias, Ciências da Natureza e suas Tecnologias e, Ciências Humanas e Sociais Aplicadas. As únicas disciplinas obrigatórias nos três anos de ensino médio regular e nos dois anos da educação de jovens e adultos são matemática e português, o que reforça a desconfiança dos especialistas de que para classes populares, ler, escrever e fazer contas é o fundamental em relação à escola, utilitarizando o ensino e reduzindo discussões críticas. Isto em função de as escolas públicas não oportunizarem toda a estrutura necessária para a ampliação do conhecimento básico, a exemplo dos que fazem boa parte das escolas privadas.

Ao pensar sobre o projeto, é importante que se perceba uma intenção pedagógica positiva, por exemplo, foi instituído o projeto de vida como componente transversal, foram abertas oportunidades de discussão e estudo de temas importantes do cotidiano, criaram-se oportunidades de vivências sensíveis na escola, etc. Contudo, é importante observar que grande parte das escolas públicas no Brasil sequer possuem salas de trabalho alternativo, como, por exemplo, artes, tecnologia, ciências. Com isso, algumas discussões e itinerários formativos podem ser surperficializados e isso reduz sua relevância para o estudante.

Em resumo, por conta deste déficit de estrutura, a proposta pedagógica fica fragilizada, o currículo perde consistência e os estudantes mais vulneráveis socialmente perdem chances de concorrer com os estudantes mais abastados por vagas nas universidades, por exemplo, em função de uma preparação deficitária, pouco crítica e restrita de meios de experimentação e até de avaliação condizente com as práticas escolares estabelecidas.

Outro ponto que nos preocupa é a diminuição de tempos de educação física. O que já era crítico por falta de espaços adequados, agora é formal e pode ser desviado para discussões que não privilegiam o esporte, a ludicidade e a atividade física na escola.

Entendemos que toda ação que caminha rumo à educação integral é boa, contudo, não se faz educação integral só com documentos, leis e currículos. Ter uma escola em condições de receber, estimular e manter os alunos é vital, construir um esforço conjunto com os educadores é outra questão vital, pois quando há dúvidas, críticas ou não aceitação da proposta, por exemplo, raramente as práticas de sala de aula vão evoluir para o desejado e haverá uma problematização tão profunda, que o processo pode se perder antes de ser implantado integralmente.

Embora consultas públicas tenham ocorrido, não atenderam às reivindicações mais relevantes dos educadores e gestores. Ficaram de fora pontos importantes, como a própria desigualdade social que afeta a implantação do novo ensino médio. Não ouvir os especialistas que atuam no cotidiano da escola é uma falta grave, e não considerar o quadro social do país na proposta de uma política unificada de educação é de fato relegar um lugar secundário aos que tem menos.

Educação integral precisa de discussão, participação e consenso. Sem isso, caminhamos rumo a um possível estrondoso fracasso da educação brasileira.

*Felipe Pitaro, gerente da Fundação Gol de Letra.

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